Sábado, meio dia, horário dos telemarketing dos bancos ligarem. Fielmente, o telefone toca. Sigh.
– Alô, com quem falo?
– André.
Até aqui, tudo tranquilo, e até pessoal. Mas são só 6 segundos até vir a voz-segue-script que todo mundo que trabalha na área tem.
– Olá. Eu sou da blá-blá-blá valorização cristã blá-blá de Bauru blá-blá num esforço para trazer a tona os valores de Cristo blá-bla…
– De Bauru? São Paulo?
– Isso mesmo, interior de São Paulo!
Interurbano interestadual. É, está mesmo barato falar em linha fixa hoje em dia…
– Então, blá-blá gostaria de saber se a maioria das pessoas da sua casa são devotos cristãos?
Sigh. Primeiro, quem que usa a palavra devoto hoje em dia? Segundo que não tem família na minha casa. Mas já que isso me tirou de My Mom’s on Facebook…
– Aqui em casa somos todos agnósticos…
– Agnósticos, o que é isso???
Ah, qualé… Está fazendo ligações sobre temas religiosos para completos desconhecidos na lista telefônica e nem se preparou minimamente das coisas que poderia ouvir. E eu, no ritmo já automatizado de explicar as coisas…
– Agnósticos, sabe… acreditamos que a questão de Deus é indecidível…
– In-den-cin-dí-vel???
Oh. Your. God. Eu estou falando com a Magda, do Sai de Baixo. Sério. A entonação da voz ficouîndêntica! E eu meio que gaguejando de surpresa, meio que segurando o riso, e ainda no ritmo de instrução…
– Indecidível, que não tem como decidir… Assim, existem os ateístas que negam Deus, e existem os relig… erm, os teístas que acreditam, os agnósticos ficam no meio… hun… a gente fica assistindo os teístas e ateístas discutindo…
Ok, isso foi péssimo. Faltaram várias palavras chaves importantes como ‘realidade objetiva’ e outras, mas para aumentar a quantidade de coisas a coordenar na minha cabeça tinha ainda o fato de eu ter tirado ela completamente do script, e eu pensando isso ao mesmo tempo, e a coisa toda numa recursão cada vez mais hilária na minha cabeça perturbada. E eis que minha interlocutora interrompe.
– Ah tá… Tá bom. Olha, eu agradeço a atenção. Obrigada. Tenha uma boa tarde. Tchau.
– Tá, tchau.
Ah… Hein?
Os meus conhecidos se espantam em saber o quanto eu posso ser irrascível com telemarketing, mas essa é a primeira vez que eu espantei alguém sem querer.
Eu juro!